Para brasileiros, solução para mudanças climáticas requer ação do governo

Gostei muito de assistir à apresentação pública da pesquisa de percepção sobre as mudanças climáticas e o meio ambiente entre os brasileiros que foi transmitida, no dia 4 de fevereiro de 2021, pelo canal do YouTube do Instituto de Tecnologia & Sociedade (ITS/Rio). Mais uma vez fica evidenciado que a população entende que os governos (34%) devem assumir a liderança na solução do problema, resultado que está alinhado com os que compilei para minha tese, sejam estudos quantitativos ou qualitativos à escala global. Os brasileiros, especificamente, distribuem também doses de responsabilidade às empresas e indústrias (32%) e a si mesmos (24%).

Ainda que 92% dos brasileiros considerem que o aquecimento global esteja acontecendo, 88% pensam que os prejuízos serão a longo prazo para as futuras gerações e 72% entendem que os efeitos das mudanças climáticas podem prejudicar muito a si e a sua família. Essa percepção mais imediatista de ser afetado pelas mudanças climáticas é acentuada para os brasileiros que se declaram pretos (80%) ou pardos (75%) em relação àqueles que se declaram brancos (68%) ou outras (67%).

Mudanças Climáticas na Percepção dos Brasileiros é uma realização do ITS/Rio em parceria com o Programa Yale de Comunicação das Mudanças Climáticas, e operacionalizada pelo Ibope Inteligência. A pesquisa teve por objetivo levantar dados sobre a percepção da população brasileira a respeito de questões relativas ao clima e ao meio ambiente.

Para além de conhecer a percepção dos brasileiros sobre as mudanças climáticas, a pesquisa também abordou a questão das queimadas. Os resultados apontam que 84% dos brasileiros acreditam que as queimadas na Amazônia prejudicam a imagem do país no exterior e 74% dizem que elas não são necessárias ao crescimento econômico. Quanto às mudanças climáticas, 78% dizem que o aquecimento global é um assunto importante e 61% manifestam estarem muito preocupados atualmente com o meio ambiente. “O recado é claro, o brasileiro se preocupa com o meio ambiente”, comenta Márcio Astrini, secretário-executivo do Observatório do Clima (OC), que esteve presente à divulgação coletiva da pesquisa em evento no canal do Instituto no YouTube.  O diretor-executivo do ITS/Rio, Fabro Steibel, ressalta que a pesquisa mostra que o brasileiro, independentemente de sua posição política, gênero e raça, se preocupa com as questões ambientais e tem uma percepção bastante elevada sobre os temas de queimadas e mudanças climáticas.

Rose Rosendo apresenta pesquisa ITS – Yale

Para 77% dos brasileiros, as queimadas são causadas pela ação humana. Para 76%, os responsáveis são os madeireiros, em primeiro lugar; agricultores, em segundo lugar, para 49%; e pecuaristas e criadores de animais, em terceiro lugar, para 48% (gráfico).

Para o pesquisador Anthony Leiserowitz, do Programa Yale, parceiro na pesquisa, a mensagem do governo Jair Bolsonaro não teve aderência com a população. Ele explica que, quando perguntados sobre as queimadas, 70% dos respondentes que se declararam de direita, dizem que os incêndios estão aumentando. “Os dados passam que a mensagem sobre os incêndios não funcionou”, diz Anthony. O secretário-executivo do OC reforça a afirmação, lembrando que o presidente da República apontou como responsável pelos incêndios os povos indígenas, em discurso na abertura virtual na 75ª Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU), no dia 22 de setembro de 2020.

Nessa mesma época, a pesquisa – Mudanças Climáticas na Percepção dos Brasileiros – estava sendo realizada em todo o país. Entre os dias 24 de setembro e 16 de outubro de 2020, 2.600 brasileiros, maiores de 18 anos, foram ouvidos por telefone com apoio de questionário eletrônico, utilizando o sistema C.A.T.I (Computer Assisted Telephone Interview). Rose Rosendo, diretora de Contas do Ibope Inteligência, apresentou os resultados da pesquisa durante o evento, enfatizando que, mesmo entre os que não acessam a internet, 59% consideram as questões das mudanças climáticas muito importantes. Rose também esclareceu que os resultados apontam que quanto maior a idade, menor a preocupação, quanto maior a escolaridade, mais as questões se tornam relevantes. Ela ressalta que entre as mulheres e os mais à esquerda observa-se um grau de preocupação um pouco maior com a questão. Rose diz que há uma diferença significativa entre homens e mulheres, pois enquanto 68% das mulheres respondentes se declaram muito preocupadas, apenas 53% dos homens o fazem.

Em relação ao que o brasileiro declara conhecer sobre o assunto das mudanças climáticas, Rose explica que a proporção vai crescendo quanto mais alto é o grau de escolaridade e vai caindo quanto menos acesso à internet ele possui. “A proporção dos que conhecem um pouco ou nada aumenta entre os não-usuários de internet”, diz, apontando que 39% dos respondentes com ensino superior declaram que conhecem muito sobre aquecimento global e mudanças climáticas, enquanto 38% dentre os não-usuários de internet declaram conhecer um pouco ou nada. Para Anthony, a pesquisa mostra que os brasileiros querem mais informação e ações. “É uma oportunidade enorme para líderes, jornalistas e educadores”, diz o pesquisador do Programa Yale.

Durante a apresentação dos resultados da pesquisa, o pesquisador do Programa Yale fez uma comparação entre brasileiros e estadudinenses, dizendo que há diferenças dramáticas entre eles.

“Os brasileiros são mais envolvidos”, disse Anthony.

Para conhecer mais sobre a comparação feita por Anthony e os comentários dos demais convidados sobre a pesquisa, assista ao vídeo da divulgação coletiva dos resultados.

Cobertura Climática – minimanual para jornalistas

Ampliar a cobertura climática e incentivar estudantes de Jornalismo a conhecerem sobre o assunto e produzirem pautas são os objetivos do “Minimanual para cobertura jornalística de mudanças climáticas”, iniciativa de grupos de pesquisa de universidades públicas lá do Rio Grande do Sul, e lançado hoje (31 de agosto de 2020) em live pela página do Observatório do Clima no Facebook.

A live contou com a participação da jornalista Sonia Bridi que comentou ser este seu assunto favorito. Sonia afirmou que o tema da emergência climática “é definidor de nosso futuro” e que, por isso, como jornalista, entende ser responsabilidade da imprensa explicar o assunto “para que as pessoas tomem suas decisões”. Sonia é autora do prefácio do Minimanual e comentou que a publicação é uma maneira de as universidades com cursos de Jornalismo se envolverem mais de perto com a temática.

Além de Sonia Bridi, participaram da live Eloisa Beling Loose, uma das organizadoras do Minimanual, em conjunto com as pesquisadoras Márcia Amaral e Ilza Girardi, e os cientistas Andrea Santos e Alexandre Costa, ambos do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC). A professora Eloisa ressaltou que o projeto coletivo quer impactar a cobertura trazendo a pauta climática para o cotidiano. Para Eloisa, o minimanual facilita o conhecimento dos aspectos científicos por parte dos estudantes de Jornalismo, uma vez que mudanças climáticas é um tema complexo.

A professora Andréa Santos da Coppe/UFRJ começou sua fala lamentando que o Brasil esteja “virando chacota do mundo” depois de ser um protagonista de peso no cenário internacional de políticas para as mudanças climáticas. Andréa mencionou a recente pesquisa Earth Day 2020, que aponta que sete em cada 10 brasileiros acreditam que as alterações climáticas são tão grave quanto a pandemia da covid-19. Andréa também comentou que o desafio da cobertura climática é relacionar o assunto com o dia a  dia das pessoas, enfatizando que as soluções existem e que é preciso promover a transição para a economia de baixo carbono.

Convidado a fazer parte da live pelo mediador Cláudio Ângelo, que o viu na platéia virtual, o professor de Ciência Atmosférica Alexandre Costa enfatizou a necessidade de falar de “ciência como um ato de rebeldia” até porque o assunto mudanças climáticas causa “o comprometimento do suporte à vida”. O cientista Alexandre, que é blogueiro e youtuber, comentou também a necessidade de se pensar numa nova dieta alimentar, com base na agroecologia, e também em práticas de pecuária que sequestrem carbono ao invés de emitirem carbono como é a que se vê, de modo geral, no Brasil.

Andréa e Alexandre ressaltaram os perigos do aquecimento para a sobrevivência das espécies e da perspectiva de se chegar a 2030 com 1,5°C. O professor Alexandre lembrou do termo “impossível de sobreviver (unsurvivable storm)” com que o Centro Nacional de Furacões dos Estados Unidos (NHC) classificou o furacão Laura. Para Alexandre, o “tom das mensagens” salvou vidas, pois é de verdade um caos climático, uma emergência climática.