Ilusão dos 2oC e a escolha de caminhos tecnológicos

As medidas para reduzir emissões por usinas de carvão como parte da estratégia do governo Barak Obama para Climate Change (CC) receberam boa repercussão na mídia norte-americana tendo ao megafone as vozes críticas de sempre, as do nicho dos republicanos, ao dizerem que CC não existe ou que as medidas são impossíveis de serem atingidas penalizando o consumidor final com custo mais elevado em eletricidade. WGIII_AR5_Cover_web

Reduzir emissões (mitigação) foi desde sempre o caminho recomendado pelo IPCC, o norte para Kyoto e para o novo acordo que ora se avizinha na COP21 em Paris no final do ano de 2015. Para que as reduções não fossem feitas a esmo, elas foram estrategicamente focadas na manutenção da temperatura média à superfície da Terra em 2oC. Para atingir esse número, conforme o carbon budget, todas as emissões de combustíveis fósseis devem ser eliminadas até 2040. O andar da carruagem mostra que 2oC é uma ilusão. A comunidade científica não escondeu isso na conferência Our Common Future Under Climate Change ocorrida em Paris, julho 2015. Os dados extraídos a partir da aplicação de modelos climáticos mostram que a temperatura da Terra já subiu para mais de 1oC e que é possível que em 2050 a temperatura ultrapasse os 2oC, trazendo mais seca, mais catástrofes, mais eventos extremos.

Será então que o discurso pessimista e depressivo de que não adianta fazer nada vai predominar? Como eu, há os que acreditam que estamos vivendo um momento de transição na busca por consolidar fontes de energia primária outras que não petróleo, gás e carvão para mover o mundo a partir da metade do século, quando a geração milênio estará na faixa dos 60 anos de idade. União Europeia segue esse caminho alinhando mudanças no estilo de vida, que tem um leque que inclui mobilidade urbana e edificações. Nos Estados Unidos, no entanto, o discurso de esperança se agarra na possibilidade de que os modelos climáticos tenham exagerado para mais uma vez que há incertezas e de que a tecnologia ajude a resolver o problema, seja por centrais de energia nuclear mais eficientes, seja por eficiência nas baterias de armazenamento para energia solar e eólica, e também por tecnologia de captura de carbono.

O discurso prometeico (de que já falamos aqui no Blog Entreposto), aquele que acredita de verdade que a tecnologia resolve problemas, é a marca registrada dos Estados Unidos, e a ele está aliado uma sociedade que vive e se acostumou à gratificação instantânea. O estilo de vida não está posto em questão. As questões culturais estão na base da busca por soluções tecnológicas. E baterias de armazenamento e captura de carbono são as novas fronteiras. Vozes menos predominantes, falam de transição, de mudança de estilo de vida, de prevenção da saúde e se alocam em institutos e organizações não-governamentais.

Política Global do Clima: primeiro round rumo a Paris 2015

Vinha acompanhando a entrega das propostas voluntárias para o Acordo de Paris sobre Climate Change e hoje encontrei uma entrevista que ajuda a costurar o que foi entregue e as perspectivas futuras para o Acordo.

Para compreender o contexto, dia 31 de março de 2015 foi o deadline para que os países entregassem seus planos e metas de emissão de carbono. A contabilidade mostra que 33 submissões foram entregues por países, cumprindo a chamada voluntária acordada em Lima (Peru) na COP 20 de tornar pública suas propostas, cujo nome técnico é Intended National Determined Contributions (INDCs).

A entrevista de Janos Pasztor (foto), de UN Assistant Secretary para o Acordo Geral de Paris 2015, ao canal France 24 rFoto UN Janos Pasztorevela que o conteúdo das propostas dos países, em sua totalidade, não permite vislumbrar um cenário de 2 Graus e que o acordo que sairá da COP 21 em Paris é um “package” que envolve metas, monitorização e descarbonização a longo prazo.

O que significa a declaração de Janos Pasztor: “it is very likely that the commitments we will get from countries will not be sufficient to meet UN’s 2°C target”? Significa que ainda que metas de redução ou teto de emissão sejam acordados, o cenário mudou e estrategistas e cientistas já começam a trabalhar com high end scenarios, ou seja, projeções para aumento de 4 Graus.

Num cenário como esse, as implicações para as populações e para as sociedades são consideráveis e as futuras generações já estão muito mais vulneráveis às questões climáticas do que podemos pensar. Lembro-me sempre de Prof. Dr. Filipe D. Santos, físico e cientista do clima português, me dizendo: “a coisa não está bonita“, num dia qualquer em setembro de 2014 ao final da aula na Universidade de Lisboa.

O Acordo de Paris, segundo Pasztor, é muito importante porque vai definir como monitorar emissões e cortes. Para mim, além disso, o Acordo de Paris vai abrir uma nova onda de discussão científica sobre cenários 4 Graus e consolidar o discurso atual de energia limpa e descarbonização via tecnologia.

A entrevista no canal France 24.

Propostas submetidas pelos 33 países – INDCs.